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O que é que está a impulsionar os protestos em África?

WASHINGTON, DC – Os jovens têm liderado protestos em grande escala em dois dos países mais influentes de África, Quénia e Nigéria. Embora muitas das exigências dos manifestantes provavelmente não sejam atendidas, as manifestações destacam a necessidade urgente de reformas fundamentais, não apenas no Quénia e na Nigéria, mas em todo o continente africano.

No Quénia, os jovens começaram a sair às ruas em junho para pôr em prática os “sete dias de fúria” – protestos massivos e em grande parte pacíficos contra uma proposta de lei financeira que aumentaria os impostos sobre uma vasta gama de bens e serviços, numa altura em que o custo de vida está a atingir um aumento significativo. Milhares de pessoas invadiram o parlamento do Quénia e o presidente William Ruto enviou o exército para exercer uma repressão violenta que, nas semanas seguintes, resultou em pelo menos 39 mortos e quase 400 feridos. Mais de 600 manifestantes foram detidos.

Apesar de inicialmente ter prometido reprimir os protestos, Ruto depressa reconheceu que o povo tinha falado, retirou o projeto de lei e dissolveu o seu gabinete. No entanto, os protestos – incluindo apelos à renúncia de Ruto – continuaram, com os jovens a exigir medidas para resolver problemas profundamente enraizados, como a corrupção governamental, a má gestão dos fundos públicos e a falta de fiscalização sobre a autoridade executiva.

Os protestos no Quénia inspiraram os jovens nigerianos, que anunciaram dez dias de manifestações contra o governo durante o mês de agosto. As suas queixas também estão, em grande medida, relacionadas com a economia e a má governação. Os custos com os combustíveis aumentaram exponencialmente, após o presidente Bola Tinubu ter suprimido um subsídio de longa data no ano passado. Além disso, o valor do naira caiu a pique, na sequência da decisão do banco central de permitir que sejam apenas as forças do mercado a determinar a taxa de câmbio.

Agora, os cidadãos nigerianos comuns – que já enfrentam um elevado número de desemprego – estão a ser aniquilados pela inflação, bem como pela escassez de alimentos e energia. No entanto, tal como no Quénia, as suas tentativas de serem ouvidos foram recebidas com violência por parte do Estado – mais de 20 pessoas perderam a vida, centenas foram detidas – e com o recolher obrigatório, precisamente quando os líderes políticos concordaram com as suas exigências apenas da boca para fora.

Os problemas que estão a impulsionar os recentes protestos não se limitam à Nigéria e ao Quénia. A elevada taxa de desemprego está a afetar a juventude urbana escolarizada em muitas zonas de África. Além disso, muitos líderes em todo o continente implementam reformas económicas que sobrecarregam desproporcionalmente os cidadãos comuns, enquanto os funcionários eleitos continuam a desfrutar de estilos de vida extravagantes. Muitos países africanos têm um histórico de violações dos direitos humanos, que não são punidas. Para se alcançar um futuro mais estável e próspero em África, é necessário agir em todas essas áreas.

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Comecemos pela abordagem predominante à reforma económica. Tanto Ruto como Tinubu argumentariam que as suas propostas políticas controversas eram do interesse dos seus países. O projeto de lei financeiro de Ruto foi concebido para reduzir o défice orçamental, controlar a dívida pública e satisfazer credores como o Fundo Monetário Internacional (que suspendeu o financiamento ao Quénia após a retirada do projeto de lei). Da mesma forma, a decisão de Tinubu de acabar com os subsídios aos combustíveis pretendia aliviar a pressão sobre as finanças públicas, enquanto a alteração no regime cambial deveria estabilizar a economia e atrair investimentos.

No entanto, implementar medidas de austeridade sem ter em consideração a capacidade das pessoas para suportá-las demonstra uma falta de empatia – até mesmo desprezo. Se os termos de um acordo de empréstimo forem demasiado onerosos, cabe ao governo renegociá-los. Os tecnocratas e os políticos responsáveis têm de transmitir ao FMI que a exigência de reformas que terão um custo excessivo para o cidadão comum torna os países vulneráveis à instabilidade, ao mesmo tempo que prejudica a legitimidade do Fundo – e de outras instituições internacionais – como parceiro dos países africanos.

Em todo o caso, se os governos africanos quiserem genuinamente reduzir os défices e as dívidas, devem tornar-se mais introspetivos. Os funcionários eleitos no Quénia e na Nigéria estão entre os mais bem pagos do mundo e também beneficiam significativamente de “fundos de desenvolvimento dos círculos eleitorais” – essencialmente, fundos secretos para políticos. O governo do Quénia está particularmente “empanturrado”.

É urgente reduzir essas despesas e seria um grande gesto de boa-fé para com os jovens. Um aumento radical na transparência – que mostre como o dinheiro público é gasto a nível nacional e subnacional e permita um acompanhamento mais fácil dessas despesas por grupos de cidadãos – também iria ajudar. Os compromissos públicos, como os assumidos através da Parceria para um Governo Aberto, são um bom primeiro passo, mas apenas se forem rapidamente apoiados por ações. Todos estes esforços são pré-requisitos para reduzir a corrupção.

Um terceiro elemento no quebra-cabeças das reformas é acabar com a impunidade da violência do Estado. Afinal de contas, as recentes repressões não são novidade em África. Na Nigéria, os protestos de 2020 contra a brutalidade policial foram novamente recebidos com mais violência por parte dos agentes de segurança, que não enfrentaram nenhum tipo de responsabilização até agora. Os protestos contra o custo de vida no ano passado no Quénia também foram reprimidos com violência, sem que ninguém tenha sido responsabilizado. Histórias semelhantes podem ser contadas sobre muitos outros países africanos, onde a repressão é frequentemente generalizada.

Acabar com essa impunidade é um primeiro passo decisivo para criar uma ordem cívica pacífica e próspera. A responsabilização deve começar com os indivíduos que diretamente infligem a violência, sejam policiais ou militares, mas também tem de se estender aos que estão no comando. Quando os protestos irrompem, o governo tem de dialogar com os manifestantes e encontrar formas credíveis de dar resposta às suas exigências. As detenções devem ser feitas apenas quando são cometidos verdadeiros crimes e os acusados têm de ter direito a julgamentos rápidos e justos.

Apesar das repressões violentas, os jovens quenianos continuam a protestar e os seus homólogos nigerianos prometeram voltar às ruas se as suas exigências não forem satisfeitas. Outros países, como o Uganda, também estão a defrontar-se com movimentos de protesto contra o governo e a corrupção. Enquanto os governos se apoiarem em táticas repressivas, em vez de realizarem reformas significativas, esses tumultos irão continuar.

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