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Um novo começo para a cooperação EUA-África?

BASILEIA – A visita recente do presidente queniano William Ruto aos Estados Unidos poderá assinalar um ponto de inflexão nas relações EUA-África. Uma colaboração mais estreita traria resultados mutuamente benéficos em questões que vão do crescimento económico à sustentabilidade planetária. Todavia, a falta de investimento, a desvalorização monetária e as taxas de juro elevadas estão a sufocar as economias africanas e a fazer descarrilar iniciativas críticas como a industrialização verde.

É do interesse da América apoiar África a ultrapassar estes obstáculos. Muitos países africanos encontram-se num estado perpétuo de instabilidade económica ou ambiental. Como os custos de financiamento internacionais permanecem elevados – devido, em parte, às taxas de juro elevadas nos EUA – os governos tiveram de saquear os seus orçamentos destinados ao desenvolvimento para o pagamento das suas dívidas. Segundo o Laboratório do Financiamento para o Desenvolvimento (FDL), pelo menos 20 países de rendimentos baixos e médio-baixos em todo o mundo enfrentarão dificuldades para renovar 600 mil milhões de dólares em dívida pública externa, entre a actualidade e 2026.

Além disso, tanto África como os EUA sofrem cada vez mais com os efeitos das alterações climáticas. As cheias recentes no Quénia ilustraram de forma trágica a necessidade da descarbonização rápida e do investimento em infra-estruturas resilientes ao clima. De modo semelhante, os tornados que recentemente afectaram as vidas dos habitantes do Iowa, do Texas, do Oklahoma e do Arkansas podem prenunciar a pior temporada de tornados do país das últimas décadas.

África reserva um grande potencial para os EUA e para outros países que estejam dispostos a investir num futuro mais verde. Muitos governos puseram os veículos eléctricos, as escolas digitalizadas e os alojamentos resilientes e eficientes em termos energéticos no topo das suas agendas políticas. O continente dispõe de uma população jovem e em rápido crescimento, e está a encetar uma via de industrialização cada vez mais assente na energia solar e renovável. No Quénia, 90% do fornecimento de energia já provém de fontes renováveis.

Mas África precisará de apoio internacional para superar vários desafios económicos e alcançar o crescimento sustentado. Os EUA podem oferecer três tipos de apoio. Em primeiro lugar, os países africanos devem ser incluídos nos esforços dos EUA para apoiar aliados em dificuldades, especialmente agora que os pacotes de despesa já foram alargados para além da Ucrânia e que chegam a um conjunto mais alargado de beneficiários. Ambos os lados beneficiariam se este apoio fosse concebido para promover o investimento na industrialização verde e em infra-estruturas resilientes ao clima em toda a África.

Num momento encorajador, os EUA e o Quénia acabaram de anunciar novas parcerias para a energia limpa, o comércio, o investimento e a tecnologia, e esperamos que os anúncios recentes de investimentos do sector privado dos EUA sublinhem a importância de África para os eleitores e consumidores dos EUA, para estímulo da cooperação e investimento futuros.

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É um bom começo; mas os EUA terão de alargar a lista de países africanos que podem beneficiar de melhores condições comerciais, no modelo definido pela Lei dos EUA para a Redução da Inflação. Também terão de rever políticas que restringem inadvertidamente o investimento no continente. A Lei Dodd-Frank de 2010, por exemplo, restringe os investimentos na República Democrática do Congo e nos seus vizinhos como forma de combate ao trabalho infantil, apesar de existirem evidências de que a provisão não tenha tido êxito a atenuar o problema. Da mesma maneira, se os EUA avançarem com a implementação de um mecanismo transfronteiriço para ajuste de carbono, terão de prever cedências para os países em desenvolvimento.

Em segundo lugar, os EUA devem aumentar as suas contribuições em iniciativas multilaterais que promovam o crescimento e desenvolvimento sustentável de África, já que estes também são do seu interesse. Um bom exemplo é a Associação Internacional de Desenvolvimento do Banco Mundial, que proporciona financiamento bonificado e subsídios aos países mais pobres do mundo. Triplicar o capital da AID até 2030 permitir-lhe-ia responder a alguns dos mais prementes desafios de desenvolvimento do mundo, nomeadamente em regiões assoladas por conflitos, graves carências de recursos ou catástrofes climáticas persistentes.

O apoio aos sistemas de saúde e de saúde pública também tem de ser continuado. Isto significa, especificamente, financiar a Gavi, a Aliança para a Vacinação, e o Fundo Global de Combate à SIDA, Tuberculose e Malária. Este ano, a AID, a Gavi e o Fundo Global procedem ao reaprovisionamento dos seus fundos e estão à procura de dinheiro nos EUA e junto de outros governos. Depois dos encorajadores anúncios de alto nível durante a visita de Ruto, África ficará à espera que os EUA avancem e reforcem o seu apoio ao longo do tempo.

Mas sem um enquadramento mais adequado à gestão da dívida, muito do apoio que os países africanos receberem da AID e de outras fontes será gasto nos custos com o endividamento e não no desenvolvimento sustentável. É por isso que os EUA também têm de oferecer uma terceira forma de apoio: liderança para reformular a abordagem insuficiente ao financiamento soberano de África.

Uma solução potencial é a “proposta de resolução(NdT: “bridge proposal”, no original) do FDL, que proporcionaria uma resolução rápida a países com problemas de liquidez e rácios de endividamento elevados. O alívio da dívida não só reforçaria a sustentabilidade financeira de longo prazo em África, mas também libertaria fundos para a industrialização verde e para outras prioridades.

Para além de aumentar as doações destinadas à AID e a outras iniciativas multilaterais, os EUA têm de encorajar as instituições para financiamento do desenvolvimento a aumentar o volume da sua assistência, e a melhorar a sua pontualidade e a sua qualidade. E os mutuários devem comprometer-se com programas que garantam o crescimento e o investimento verdes, já que isso os ajudará a crescer para além do endividamento. O círculo virtuoso poderá ser concluído com programas para atrair financiamento mais barato e de maior prazo junto do sector privado, através de mecanismos de financiamento mais flexíveis.

A Visão Nairobi-Washington, anunciada durante a visita de Ruto à Casa Branca, corporiza o tipo de compromisso de que ambas as partes necessitam. Em vez de ser apenas um cabeçalho isolado, a viagem de Ruto pode assinalar o início de uma nova fase no diálogo entre América e África. Esperamos que este reforço do envolvimento origine formas de cooperação mais duradouras e eficazes. A industrialização verde no continente interessa tanto a África como à América. Mas para que os novos compromissos frutifiquem, os EUA têm de apoiar África de forma mais sistemática, e com uma base multilateral. A crise de endividamento de África, apesar de dolorosa, poderá ser a solução para conceber uma abordagem mais clarividente dos EUA ao continente e aos seus desafios.

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