NOVA IORQUE – Terminada a I Guerra Mundial, Havana emergiu como uma das cidades mais vibrantes do mundo. Na primeira metade de 1920, os preços crescentes do açúcar e um ambiente favorável permitiram a entrada de crédito e financiamento em Cuba, alimentando a chamada Dança dos Milhões. Mas, como David Lubin recorda no seu livro Dance of the Trillions, a festa terminou repentinamente antes do fim do ano, em grande parte devido às subidas das taxas de juro nos EUA, que atraíram novamente a liquidez para os Estados Unidos. A indústria açucareira de Cuba nunca recuperou.
Com o crédito dos EUA a entidades não-bancárias de países em desenvolvimento a mais do que duplicar desde a crise financeira global de 2018 – e a atingir os 3,7 biliões de dólares no fim de 2017 – a experiência de Cuba deveria servir de aviso. Mas, para os países actualmente em desenvolvimento, existe uma complicação adicional: as finanças globais são cada vez mais governadas não pelo Consenso de Washington, que encoraja a transparência e o cumprimento de regras que se aplicam a todos, mas antes por um opaco e enviesado “Consenso de Beijing”.
A China é agora a segunda maior economia do mundo e o principal fornecedor de crédito a mercados emergentes em todo o mundo, tendo ocupado o espaço deixado pelo retrocesso dos credores ocidentais. Os termos destes créditos são tão obscuros, que apenas a China tem informações sobre o volume, prazo e custo dos empréstimos contraídos; estas informações são divulgadas bilateralmente, muitas vezes por motivos políticos ou estratégicos. Consequentemente, nunca foi tão difícil avaliar a sustentabilidade da dívida.
Mas existem bons motivos para crer que muitos países enfrentem riscos graves. Segundo o Fundo Monetário Internacional, mais de 45% dos países de baixos rendimentos estão sobre endividados, ou perto disso. E a agência de notação de crédito Moody’s salienta que muitos dos países que a China escolheu para participarem na sua Iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” estão entre os mais financeiramente inseguros do mundo.
Os países não precisam de estar à mercê dos grandes credores como a China. Segundo o FMI, os bens públicos de todo o mundo valem pelo menos o dobro do PIB global. Em vez de negligenciarem esses activos, como faz actualmente a maioria dos governos, os países deveriam usá-los para criar valor.
A maioria dos governos detém aeroportos, portos, sistemas metropolitanos de transporte e serviços de utilidade pública, para não mencionar muito mais imobiliário do que as pessoas normalmente imaginam. Por exemplo, as demonstrações financeiras de Boston indicam que a cidade tem um valor líquido negativo. Mas os activos imobiliários totais de Boston valem na verdade quase 40 vezes mais que o seu valor contabilístico, porque estão registados ao seu custo histórico. Por outras palavras, a cidade tem quantidades enormes de riqueza oculta.
At a time of escalating global turmoil, there is an urgent need for incisive, informed analysis of the issues and questions driving the news – just what PS has always provided.
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E Boston dificilmente será um caso único. O imobiliário público vale frequentemente perto de 100% do PIB de uma jurisdição, o equivalente a um quarto do valor total do mercado imobiliário. Os governos não compreendem isto, e incorrem em custos de oportunidade substanciais.
Com uma gestão profissional e politicamente independente, é razoável admitir que uma cidade pudesse auferir um rendimento de 3% sobre os seus activos comerciais. Isto traduzir-se-ia em receitas muitas vezes superiores ao actual plano de investimentos de Boston. Com efeito, para muitas economias, a gestão profissional dos activos públicos poderia gerar anualmente mais receitas que as dos impostos sobre as sociedades, e aumentaria consideravelmente o capital disponível para financiar o investimento em infra-estruturas.
Esta abordagem é comprovada, nomeadamente, por cidades asiáticas como Singapura e Hong Kong, que em dada altura eram tão pobres como muitas das cidades na Ásia actualmente em desenvolvimento, e certamente muito menos prósperas do que a Havana do passado. Vale a pena lembrarmos que, quando Singapura conseguiu a independência no fim da década de 1960, dificilmente podia ser considerada um local muito prometedor. Na verdade, era mais perigosa e arriscada do que a maioria das cidades actuais.
Nessa época, poucos esperavam que Singapura sobrevivesse, quanto mais prosperar. O primeiro primeiro-ministro de Singapura, Lee Kuan Yew, é frequentemente citado como tendo dito (em 1957) que a ideia de uma Singapura potencialmente independente era um “absurdo político, económico e geográfico”.
Ainda assim, conseguiu prosperar, em parte graças à sua decisão pouco ortodoxa de libertar a sua riqueza pública, integrando carteiras de activos em fundos públicos, responsabilizando gestores profissionais pelos activos comerciais públicos.
A Temasek e a GIC, empresas de participações criadas pelo governo, usaram ferramentas de gestão originárias do sector privado para financiarem o desenvolvimento económico de Singapura. O HDB, o fundo de habitação de Singapura, disponibilizou habilitação pública a 80% dos cidadãos da cidade-estado.
Do mesmo modo, na década de 1990, a estagnação económica e o desemprego elevado obrigaram os responsáveis por Copenhaga a serem criativos, transferindo a antiga zona do porto da cidade, bem como um antigo quartel nos arredores da cidade, para um fundo público gerido por profissionais. Para além de transformar a zona do porto da cidade numa área altamente procurada, o fundo permitiu que o governo construísse um sistema de trânsito, sem precisar de aplicar receitas fiscais.
Igualmente, Hong Kong, perfeitamente ciente das suas próprias limitações fiscais, encontrou uma maneira de construir um sistema ferroviário e de metropolitano do tamanho do de Nova Iorque sem usar um único dólar dos impostos: promoveu o imobiliário adjacente às suas estações.
É inegável que a dependência do capital externo acarreta riscos graves, especialmente quando esse capital pode fugir rapidamente, como Cuba aprendeu da pior maneira. Porém, a alavancagem dos activos públicos existentes pode fortalecer as finanças públicas, estimular a sustentabilidade da dívida, e melhorar a credibilidade, consolidando o desenvolvimento económico no longo prazo. Não deveria ser necessária uma crise para instigar os governos a tomarem este rumo.
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With German voters clearly demanding comprehensive change, the far right has been capitalizing on the public's discontent and benefiting from broader global political trends. If the country's democratic parties cannot deliver, they may soon find that they are no longer the mainstream.
explains why the outcome may decide whether the political “firewall” against the far right can hold.
The Russian and (now) American vision of "peace" in Ukraine would be no peace at all. The immediate task for Europe is not only to navigate Donald’s Trump unilateral pursuit of a settlement, but also to ensure that any deal does not increase the likelihood of an even wider war.
sees a Korea-style armistice with security guarantees as the only viable option in Ukraine.
Rather than engage in lengthy discussions to pry concessions from Russia, US President Donald Trump seems committed to giving the Kremlin whatever it wants to end the Ukraine war. But rewarding the aggressor and punishing the victim would amount to setting the stage for the next war.
warns that by punishing the victim, the US is setting up Europe for another war.
Within his first month back in the White House, Donald Trump has upended US foreign policy and launched an all-out assault on the country’s constitutional order. With US institutions bowing or buckling as the administration takes executive power to unprecedented extremes, the establishment of an authoritarian regime cannot be ruled out.
The rapid advance of AI might create the illusion that we have created a form of algorithmic intelligence capable of understanding us as deeply as we understand one another. But these systems will always lack the essential qualities of human intelligence.
explains why even cutting-edge innovations are not immune to the world’s inherent unpredictability.
NOVA IORQUE – Terminada a I Guerra Mundial, Havana emergiu como uma das cidades mais vibrantes do mundo. Na primeira metade de 1920, os preços crescentes do açúcar e um ambiente favorável permitiram a entrada de crédito e financiamento em Cuba, alimentando a chamada Dança dos Milhões. Mas, como David Lubin recorda no seu livro Dance of the Trillions, a festa terminou repentinamente antes do fim do ano, em grande parte devido às subidas das taxas de juro nos EUA, que atraíram novamente a liquidez para os Estados Unidos. A indústria açucareira de Cuba nunca recuperou.
Com o crédito dos EUA a entidades não-bancárias de países em desenvolvimento a mais do que duplicar desde a crise financeira global de 2018 – e a atingir os 3,7 biliões de dólares no fim de 2017 – a experiência de Cuba deveria servir de aviso. Mas, para os países actualmente em desenvolvimento, existe uma complicação adicional: as finanças globais são cada vez mais governadas não pelo Consenso de Washington, que encoraja a transparência e o cumprimento de regras que se aplicam a todos, mas antes por um opaco e enviesado “Consenso de Beijing”.
A China é agora a segunda maior economia do mundo e o principal fornecedor de crédito a mercados emergentes em todo o mundo, tendo ocupado o espaço deixado pelo retrocesso dos credores ocidentais. Os termos destes créditos são tão obscuros, que apenas a China tem informações sobre o volume, prazo e custo dos empréstimos contraídos; estas informações são divulgadas bilateralmente, muitas vezes por motivos políticos ou estratégicos. Consequentemente, nunca foi tão difícil avaliar a sustentabilidade da dívida.
Mas existem bons motivos para crer que muitos países enfrentem riscos graves. Segundo o Fundo Monetário Internacional, mais de 45% dos países de baixos rendimentos estão sobre endividados, ou perto disso. E a agência de notação de crédito Moody’s salienta que muitos dos países que a China escolheu para participarem na sua Iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” estão entre os mais financeiramente inseguros do mundo.
Os países não precisam de estar à mercê dos grandes credores como a China. Segundo o FMI, os bens públicos de todo o mundo valem pelo menos o dobro do PIB global. Em vez de negligenciarem esses activos, como faz actualmente a maioria dos governos, os países deveriam usá-los para criar valor.
A maioria dos governos detém aeroportos, portos, sistemas metropolitanos de transporte e serviços de utilidade pública, para não mencionar muito mais imobiliário do que as pessoas normalmente imaginam. Por exemplo, as demonstrações financeiras de Boston indicam que a cidade tem um valor líquido negativo. Mas os activos imobiliários totais de Boston valem na verdade quase 40 vezes mais que o seu valor contabilístico, porque estão registados ao seu custo histórico. Por outras palavras, a cidade tem quantidades enormes de riqueza oculta.
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Com uma gestão profissional e politicamente independente, é razoável admitir que uma cidade pudesse auferir um rendimento de 3% sobre os seus activos comerciais. Isto traduzir-se-ia em receitas muitas vezes superiores ao actual plano de investimentos de Boston. Com efeito, para muitas economias, a gestão profissional dos activos públicos poderia gerar anualmente mais receitas que as dos impostos sobre as sociedades, e aumentaria consideravelmente o capital disponível para financiar o investimento em infra-estruturas.
Esta abordagem é comprovada, nomeadamente, por cidades asiáticas como Singapura e Hong Kong, que em dada altura eram tão pobres como muitas das cidades na Ásia actualmente em desenvolvimento, e certamente muito menos prósperas do que a Havana do passado. Vale a pena lembrarmos que, quando Singapura conseguiu a independência no fim da década de 1960, dificilmente podia ser considerada um local muito prometedor. Na verdade, era mais perigosa e arriscada do que a maioria das cidades actuais.
Nessa época, poucos esperavam que Singapura sobrevivesse, quanto mais prosperar. O primeiro primeiro-ministro de Singapura, Lee Kuan Yew, é frequentemente citado como tendo dito (em 1957) que a ideia de uma Singapura potencialmente independente era um “absurdo político, económico e geográfico”.
Ainda assim, conseguiu prosperar, em parte graças à sua decisão pouco ortodoxa de libertar a sua riqueza pública, integrando carteiras de activos em fundos públicos, responsabilizando gestores profissionais pelos activos comerciais públicos.
A Temasek e a GIC, empresas de participações criadas pelo governo, usaram ferramentas de gestão originárias do sector privado para financiarem o desenvolvimento económico de Singapura. O HDB, o fundo de habitação de Singapura, disponibilizou habilitação pública a 80% dos cidadãos da cidade-estado.
Do mesmo modo, na década de 1990, a estagnação económica e o desemprego elevado obrigaram os responsáveis por Copenhaga a serem criativos, transferindo a antiga zona do porto da cidade, bem como um antigo quartel nos arredores da cidade, para um fundo público gerido por profissionais. Para além de transformar a zona do porto da cidade numa área altamente procurada, o fundo permitiu que o governo construísse um sistema de trânsito, sem precisar de aplicar receitas fiscais.
Igualmente, Hong Kong, perfeitamente ciente das suas próprias limitações fiscais, encontrou uma maneira de construir um sistema ferroviário e de metropolitano do tamanho do de Nova Iorque sem usar um único dólar dos impostos: promoveu o imobiliário adjacente às suas estações.
É inegável que a dependência do capital externo acarreta riscos graves, especialmente quando esse capital pode fugir rapidamente, como Cuba aprendeu da pior maneira. Porém, a alavancagem dos activos públicos existentes pode fortalecer as finanças públicas, estimular a sustentabilidade da dívida, e melhorar a credibilidade, consolidando o desenvolvimento económico no longo prazo. Não deveria ser necessária uma crise para instigar os governos a tomarem este rumo.