rodrik201_Craig F. WalkerThe Boston Globe via Getty Images_nursing home Craig F. Walker/The Boston Globe via Getty Images

Por que os serviços precisam de uma política industrial

CAMBRIDGE – Bons empregos tornaram-se prioridade mundial. Formuladores de políticas nas economias avançadas e em desenvolvimento estão enfatizando a necessidade de se oferecer bem remuneradas oportunidades de emprego com segurança e planos de carreira. A globalização e a mudança tecnológica deixaram dolorosamente claro que essa tarefa não pode ser deixada inteiramente para os mercados.

Sempre que formuladores de políticas falam sobre a criação de bons empregos, eles normalmente se concentram em coisas como salários mínimos, negociação coletiva e investimentos em capacitação profissional. Mas, por mais importantes que sejam,  essas intervenções  não são suficientes. A produtividade é fundamental. A oferta de bons empregos só pode aumentar se os empregos criados para a base e o meio da distribuição de capacitações se tornarem mais produtivos, permitindo salários mais altos, mais autonomia e melhores perspectivas de carreira para aqueles que os detêm. Caso contrário, exigir salários mais altos e melhores condições de trabalho pode produzir trabalhadores menos instruídos sem oportunidades de emprego. A França, com sua elevada taxa  de desemprego juvenil, aponta para essa realidade.

Outro problema, no entanto, é que mesmo quando formuladores de políticas falam sobre políticas industriais e de inovação que visam especificamente o aumento da produtividade e novas tecnologias, bons empregos são tratados como uma questão secundária. Nos Estados Unidos, a última safra dessas políticas visa a fabricação avançada, como semicondutores (por meio da Lei CHIPS) e tecnologias verdes (por meio da Lei da Redução da Inflação); e na Europa, o foco está na “digitalização” ao lado da transição verde. Em ambos os cenários, presume-se simplesmente que bons empregos surgirão como um subproduto desses programas, mesmo que esse não seja seu objetivo principal.

Na verdade, é improvável que as tecnologias verdes e a fabricação avançada sejam uma importante fonte de criação líquida de empregos para os tipos de trabalhadores mal atendidos pelos atuais mercados de trabalho. Afinal, a indústria emprega menos de um em cada dez trabalhadores nos EUA, e a experiência de outros países onde a produção tem se saído muito melhor (como AlemanhaCoréia do Sul e Taiwan ) sugere que reverter a desindustrialização do emprego é extremamente difícil – na realidade, sem precedentes.

Uma vez que a maior parte dos futuros empregos virá dos serviços, é aí que devemos concentrar nossos esforços para criar empregos produtivos para trabalhadores menos favorecidos. Em  um novo estudo para o Projeto Hamilton, descrevo como poderia ser uma política industrial de serviços para os EUA.

Minha proposta tem tanto um componente local como um nacional. O componente local baseia-se nos existentes programas de desenvolvimento e assistência empresarial que assumem a forma de parcerias colaborativas entre agências de desenvolvimento, empresas e outras partes interessadas com o objetivo de revitalizar as comunidades e criar bons empregos. A iniciativa nacional conta com uma Agência de Projetos de Pesquisa Avançada (APPA) focada na promoção de um tipo particular de inovação: tecnologias ​​favoráveis ao emprego.

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Considere-se o que talvez seja o caso de teste mais difícil para essas ideias: cuidados de longo prazo. Este é um setor em que o emprego aumentará rapidamente à medida que a população continua a envelhecer e à medida que aumenta a demanda por arranjos domiciliares ou de vida assistida. Mas como a maior parte do trabalho de cuidados de longo prazo é feito em casa (através de agências que fornecem cuidadores ou através de cuidadores autônomos) ou em comunidades de vida assistida ou de aposentadoria pouco regulamentadas, a remuneração e as condições de trabalho têm sido tradicionalmente ruins – características que resumem os maus empregos. Os funcionários são em sua maioria mulheres – e desproporcionalmente mulheres negras – e, como seu trabalho é normalmente considerado de baixa qualificação, elas não são vistas como profissionais reais.

De que maneira os empregos em cuidados de longo prazo podem ser melhorados? O economista do MIT, Paul Osterman, sugere três estratégias gerais. Primeiro, o governo pode impor padrões, como salários mínimos mais altos. Em segundo lugar, formuladores de políticas podem aumentar as taxas de reembolso do Medicaid e do Medicare para serviços de assistência, na esperança de que isso leve a um aumento nos salários. E, terceiro, a produtividade dos trabalhadores de cuidados diretos pode ser aumentada, o que ajudaria o sistema de cuidados de longo prazo a melhor atender às necessidades dos pacientes e reduzir custos, gerando espaço para uma remuneração melhor.

Embora as duas primeiras estratégias possam ser úteis, os aprimoramentos na produtividade são, em última análise, a fonte mais confiável de melhores empregos. Para esse fim, Osterman sugere uma abordagem análoga ao método pioneiro das montadoras japonesas de implantar inovações de ponta na fabricação. Isso implica uma combinação de investimento nas capacitações dos trabalhadores, ou seja, proporcionar aos trabalhadores maior voz, discrição e autonomia, como também dando-lhes mais responsabilidade pela qualidade do serviço.

Profissionais de saúde com maior autonomia e poder de decisão poderão usar seu conhecimento sobre residentes e pacientes para personalizar seus serviços e proporcionar mais flexibilidade (como horários, alimentação e tratamento). É importante ressaltar que essa estratégia também permitiria a introdução de novas tecnologias que complementam as habilidades dos cuidadores – como ferramentas digitais com as quais os cuidadores podem coletar informações em tempo real e responder com mais rapidez e eficiência às necessidades de seus atendidos.

Essas mudanças exigiriam uma predisposição para experimentar novas práticas de trabalho e esforços contínuos, passando da pesquisa e desenvolvimento e da introdução de novas tecnologias para cuidados de longo prazo para adoção local, adaptação e contextualização em comunidades específicas. Se os cuidados de longo prazo forem melhor gerenciados dessa maneira, os benefícios da produtividade apareceriam em menor rotatividade entre os profissionais de saúde, taxas de hospitalização reduzidas, melhor gerenciamento de condições crônicas e transições mais rápidas e suaves para fora das instalações de cuidados intensivos.

Nada disso será fácil. Aumentar a produtividade nos serviços é notoriamente difícil e muitas vezes se vê impedido por inúmeras regulamentações bem-intencionadas de licenciamento, segurança e outras. Mas se não conseguirmos encontrar maneiras de aumentar a produtividade nas ocupações para as quais nossos trabalhadores estão destinados, acabaremos com uma economia de “maus empregos” bem pior e menos inclusiva.

Tradução de Anna Maria Dalle Luche, Brazil

https://prosyn.org/o0Cs5lypt